Cresce grupo de apoio a comprador compulsivo

No dia em que o contador de 31 anos não conseguiu mais pagar a comida nem o passe de ônibus, entendeu que tinha um problema.

“Cheguei ao fundo do poço em três anos. Devia cerca de R$ 35 mil quando ganhava R$ 1.000 por mês.”

O contador, que não quer se identificar, participa de reuniões do Devedores Anônimos em São Paulo, um grupo de apoio a pessoas que sofrem de compulsão pelas compras (oniomania).
Desde 2010, três grupos desse tipo foram abertos na capital paulista, na Grande São Paulo e no Rio de Janeiro. Em São Paulo, o grupo mais antigo, que funciona nos Jardins desde 1998, aumentou o número de encontros de um para dois por semana desde janeiro.

E clínicas privadas, como a Greenwood, começaram a tratar a doença junto com a dependência química.

MAIS CRÉDITO

“Nos últimos cinco anos, percebemos, com a maior facilidade de obtenção de crédito, um aumento dos problemas dos compradores compulsivos”, diz Marcelo Niel, especialista da área de psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo.

“É o mesmo fenômeno que ocorreu com a abertura dos bingos na cidade, quando registramos um aumento da dependência pelo jogo”, acrescenta o especialista, que destaca a incidência do problema entre os mais pobres.

Com uma dívida de R$ 3 milhões com bancos, um empresário de 45 anos, que também não quer se identificar, teve de mudar completamente o estilo de vida para tentar superar a doença.

“Minha compulsão por comprar era tão forte que chegava a gastar R$ 400 em molho italiano no supermercado. Endividei minha empresa, minha família”, diz, na saída da reunião do grupo de apoio nos Jardins.

Juan Pablo Roig e Monique Brandão, psicólogos da clínica Greenwood, dizem que, na patologia, a compra funciona como uma droga. Além disso, as pessoas que sofrem de oniomania costumam ter outros vícios, como as próprias drogas ou sexo.

Indicadores mostram um aumento preocupante da inadimplência no Brasil. Segundo o Banco Central, a taxa chegou a 8% em maio, o maior nível desde 1999.

De acordo com levantamento da Serasa Experian, 60% dos inadimplentes têm dívidas superiores ao valor total da renda.

Nem todas as pessoas afogadas em contas, no entanto, sofrem de uma doença, mas há sinais –por exemplo, se os débitos são maiores que o patrimônio– que podem indicar um problema sério.

“Não é porque uma pessoa cria novas dívidas que ela tem a doença. Na maioria dos casos, os problemas são por falta de educação financeira”, diz o consultor Marco Gazel.

Texto: MARÍA MARTÍN
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA Link

 

 

 

 

 

 

Inadimplência aumenta mais de 19% no 1º semestre no Brasil

A maioria dos brasileiros se enrolou com pequenas dívidas do dia a dia, usando o cheque especial e o cartão de crédito.

O Brasil tem mais famílias endividadas e as dívidas estão cada vez maiores. Uma pesquisa recente mostra que o número de pessoas que não conseguem pagar as contas aumentou 19% no primeiro semestre.

Por isso, a maior cidade do Brasil – São Paulo – começa nesta quarta-feira (25) uma feira para ajudar quem está enrolado com as contas. Além de equilibrar o orçamento, o consumidor tem que controlar o impulso de comprar mais e mais.

Para muita gente, as compras se transformaram em uma compulsão, parecida com um vício. Mas, a maioria dos brasileiros se enrolou com pequenas dívidas do dia a dia, usando o cheque especial e o cartão de crédito.

As nossas dívidas estão maiores do que nunca. Aumentou demais o número de consumidores que não estão conseguindo pagar o que devem.

A inadimplência no país aumentou mais de 19% no primeiro semestre com relação ao mesmo período do ano passado. Segundo levantamento feito pela Serasa, 60% dos inadimplentes tem dívidas acima da própria renda.

Quem já sofreu com dívidas aprendeu algumas lições básicas, principalmente com relação ao cartão de crédito.

Tem gente que se encanta com um produto, mesmo que não precise dele. Com a internet ficou muito mais fácil fazer compras, e o ato de comprar foi virando quase um vício. A pessoa começa a comprar e não consegue mais parar.

Alguns psicólogos e psiquiatras chegam a tratar o comprador compulsivo como se ele fosse um dependente químico.

“Alguns pacientes dependentes químicos que também eram compradores compulsivos relatavam uma euforia muito semelhante a que eles tinham quando usavam cocaína, no momento que eles tinham a compra. E depois da compra, geralmente eles têm uma angústia, uma sensação de fracasso”, explica o médico Juan Pablo Roig Albuquerque.

“O que é saudável é a pessoa saber o que ela pode. E agora o que não é saudável é quando ela compra mais. Dez vezes mais do que ela ganha, 20 vezes mais do que ela ganha. E o sofrimento é muito grande”, afirma a psicóloga Monique Brandão de Freitas.

Fonte: Bom Dia Brasil

Tratamento para Compulsão por Compras

A Clínica Greenwood começou a oferecer tratamento para compulsão por compras no ano passado, diante do aumento dos casos.

A oniomania

Quando se analisa o perfil de pessoas excessivamente endividadas, em muitos casos verifica-se que elas sofrem de uma patologia chamada oniomania, ou compulsão por compras. Trata-se de um transtorno que foi descrito como síndrome psiquiátrica pela primeira vez no início do século passado. É uma condição crônica, sendo que as mulheres correspondem a mais de 80% dos casos, conforme um estudo dos pesquisadores Hermano Tavares, Daniela Lobo, Daniel Fuentes e Donald Black, publicado na “Revista Brasileira de Psiquiatria”.

Nos últimos anos, a Clínica Greenwood, especializada no tratamento de dependência química, drogas e alcoolismo, começou a ser procurada também por compradores compulsivos, bem como por seus familiares. Em meados de 2011, passou a atender casos de oniomania. A psicóloga da clínica, Monique Brandão de Freitas, diz que o processo no organismo das pessoas com a patologia se assemelha ao de um dependente de drogas ou álcool. “O sistema lím- bico é atingido”, explica. Isso significa que, no momento da compra, elas são tomadas por uma viciante sensação de prazer.

Assim como as demais dependências, a oniomania possui cinco fases. Na primeira, a pessoa aumenta a frequência das compras gradativamente. Na segunda, começa a abusar e, na terceira, já está dependente. Geralmente, é quando as dívidas aparecem. Pedir dinheiro à família é outro sintoma dessa etapa. Na quarta fase, ocorre a total ausência do senso crítico. Na última, o consumidor passa por uma falência moral, física e psicológica. “Muitos casais se separam por conta desse problema”, relata Monique.

Aos 18 anos de idade, no geral, o indivíduo já começa a manifestar certa predisposição à oniomania, porém a patologia costuma aparecer mesmo pouco antes dos 30 anos. Há uma explicação para isso. No início da vida adulta, as pessoas possuem inúmeros sonhos e projetos. Poucos anos depois, as frustrações começam a surgir, o que frequentemente coincide com a independência financeira.

O psiquiatra Juan Albuquerque, também da clínica Greenwood, lembra que uma das principais características do compulsivo é a prevalência de pensamentos intrusivos que incomodam e são aliviados com a compra. “A pessoa sabe que se gastar vai contrair uma dívida e, mesmo assim, não consegue resistir”, afirma. Ele enfatiza que a internet agravou o quadro para a patologia, já que o consumidor não precisa nem mesmo sair de casa. Há situações, porém, em que o estrago é feito in loco. Albuquerque lembra o caso extremo de um paciente que comprou em um único dia quatro caminhonetes e três televisores de tela plana. Em situações como esta, explica, é preciso investigar se a pessoa possui outros problemas psiquiátricos.

José Geraldo Tardin, presidente do Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec), também acumula histórias. Ele relata o caso de uma mulher que foi declarada insolvente (confira na página 23 como funciona a insolvência civil) e teve de ser “interdita- da” por um familiar, que por determinação do juiz passou a administrar todos os seus recursos. As dívidas dela somavam mais de R$ 1 milhão e, apesar do salário altíssimo, ela não tinha patrimônio. “Lembro-me de uma vez em que ela entrou em uma loja e comprou quatro bolsas, que somaram R$ 30 mil.”

Há uma Imelda em cada um.

Como a lendária ex-primeira-dama 
filipina, muita gente compra demais. 
E isso pode ser uma doença

Há em cada um de nós uma Imelda Marcos, a lendária ex-primeira-dama das Filipinas que se tornou símbolo de consumismo sem freios e de acumulação de bens além de qualquer bom senso. Quando uma revolução depôs seu marido, o cleptomaníaco ditador Ferdinand Marcos, em 1986, os revolucionários espantaram-se ao encontrar em seus armários um estoque de 3.000 pares de calçado. A advogada gaúcha Christiane Ávila, 32 anos, tem mais de sessenta pares de sapatos no armário – o que é um espanto para quem não é Imelda Marcos. Muitos deles permanecem há meses na caixa e nunca foram usados. Só numa loja de roupas, ela chegou a fazer doze carnês de compras a prazo em apenas um mês. Na volta para casa, as sacolas vinham escondidas no porta-malas do carro para que o marido não as visse. “Quando estava triste, ia ao shopping fazer compras e, se estava feliz, também comprava. Não conseguia me controlar”, conta Christiane, que tinha uma coleção de cinco cartões de crédito. Foram necessários quatro anos – e 7.000 reais em dívidas – para que ela descobrisse que não era uma mulher fútil e perdulária, mas portadora de uma das chamadas doenças da civilização: a compulsão para as compras. Apesar de pouco conhecido, esse mal, cujo nome científico é oneomania, afeta 1% da população mundial, segundo estimativa da Associação Americana de Psiquiatria. Christiane conseguiu controlar o problema com o auxílio de terapia e de um medicamento para estabilizar o humor. “Cancelei quatro dos meus cinco cartões de crédito e estou proibida de ir ao shopping sozinha”, diz. “Só vou junto com o meu marido, e aí ele não me deixa comprar nada.”

Os compradores compulsivos costumam adquirir produtos que nunca vão usar e deixam de pagar contas essenciais por causa dos gastos supérfluos. Cartões de crédito e cheques especiais lhes proporcionam uma sensação de poder e eles não resistem a uma liquidação. As mulheres representam quase 80% dos casos. Os primeiros sinais do distúrbio costumam surgir ainda na adolescência, mas é comum a procura por ajuda só acontecer quando as dívidas se tornam maiores que a capacidade de pagá-las. O tratamento envolve psicoterapia e, dependendo do caso, medicamentos. “No momento do impulso, essas pessoas perdem a noção de certo e errado”, diz o psiquiatra gaúcho Diogo Lara. Ele afirma que oito em cada dez pacientes que sofrem de transtorno bipolar – doença que se caracteriza pela alternância de momentos de euforia e de depressão, com períodos de normalidade nos intervalos – apresentam compulsão para as compras. “Tenho uma paciente que roubou o cartão de crédito da mãe e comprou 2.000 reais em perfumes. Depois, sentiu um enorme remorso”, diz Lara, que recentemente lançou o livro Temperamento Forte e Bipolaridade.

A compulsão para as compras, naturalmente, é favorecida pelo incessante incentivo ao consumo na vida moderna. Nunca houve tanto crédito disponível para quem está disposto a se endividar. Os bancos distribuem cartões e concedem cheques especiais com liberalidade. No caso dos gastadores compulsivos, esses recursos se transformam numa terrível armadilha. Também nunca houve tanta oferta de produtos, que não são mais vendidos apenas em lojas, mas também pela televisão e pela internet. Essas mercadorias, por sua vez, são substituídas por novos lançamentos em velocidade avassaladora. “Quanto mais consumista a sociedade, maior o número de gastadores compulsivos”, diz o neuropsicólogo Daniel Fuentes, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo. Segundo Fuentes, compradores compulsivos sofrem de uma desordem do impulso. “São pessoas que não conseguem resistir a uma forte pressão interna para comprar alguma coisa. Qualquer coisa.” Freqüentemente, também apresentam outros comportamentos compulsivos, como comer ou beber além da conta. “Eles tendem a tomar atitudes imediatistas e têm pouca capacidade de planejamento e organização no dia-a-dia”, diz Fuentes.

Os grupos de auto-ajuda são um recurso valioso no controle da oneomania. Inspirados nos Alcoólicos Anônimos (AA), os Devedores Anônimos (DA) surgiram em 1968 nos Estados Unidos justamente para ajudar quem perde o controle de seus gastos e, conseqüentemente, de suas dívidas. Hoje, há mais de 500 grupos de Devedores Anônimos espalhados por dezoito países. O primeiro grupo brasileiro foi criado há seis anos, em São Paulo. Hoje já existem dez, em quatro Estados. Por aqui, não existem estatísticas sobre a quantidade de gastadores compulsivos. Mas uma pesquisa da Associação Nacional de Defesa dos Consumidores do Sistema Financeiro (Andif) com 6.000 inadimplentes revela que 30% deles se endividaram comprando produtos supérfluos.

“Comecei a freqüentar o DA há um ano e já consigo me controlar mais”, diz Teresa (nome fictício), uma enfermeira que chegou a ter dezessete cheques devolvidos e acumulou dívidas de 15.000 reais. Tudo gasto em supérfluos – roupas, sapatos, perfumes e maquiagem. “Uma vez fui a uma financeira e fiz um empréstimo de 1.000 reais”, conta a enfermeira. “Saí de lá direto para um shopping e torrei tudo em roupas.” Nas reuniões, os gastadores dispõem de um tempo para falar sobre seus problemas, são aconselhados a anotar minuciosamente seus gastos e despesas todos os dias e a aposentar cartões de crédito e talões de cheques. Foi exatamente essa a alternativa encontrada por Laura (nome fictício), uma funcionária pública aposentada que freqüenta as reuniões há dois anos e hoje só faz pagamentos em dinheiro. No auge da crise, ela contraía um empréstimo num banco para pagar a dívida feita em outro. “Não me interessava pelo preço do produto, só queria saber em quantos meses eu podia pagar”, ela relata. Apesar de muitas vezes ainda sentir vontade quase incontrolável de ir às compras, Laura agora consegue refrear seus impulsos repetindo para si mesma o lema do grupo: só mais 24 horas sem fazer nenhuma dívida.

Comprar sem necessidade pode ser sinal de doença

Oniomania,

Uma doença que pode levar a pessoa ao desespero, falência financeira e moral. Perdas irreparáveis e rompimento de relacionamentos familiares. Algumas pessoas quando estão se sentindo tristes e solitárias tendem a buscar os shopping  como uma compensação para seu sentimento de insatisfação. Também é uma forma de compensar sentimentos de baixa estima e outras sensações desagradáveis que ficam “camufladas” temporariamente, oferecendo alívio momentâneo.

No mundo de hoje há uma pressão para o consumismo, resistir não é uma tarefa fácil, principalmente para os compulsivos. Na maioria das vezes as escolhas frente às compras se devem ao emocional e não à razão.

Estudos já constataram que os aromas influenciam no campo do marketing, como por exemplo, menta e erva-doce que reduzem a sensação de estar em lugares fechados; aromas frescos dão a sensação de bem estar e liberdade; aromas de chocolates estimulam o bem estar e prazer. A sensação de entrar em uma loja com aroma de roupas novas estimula o indivíduo às compras e ao prazer. O olfato afeta positivamente o cérebro como o cheiro de fumaça ativa o cérebro de um fumante e o leva imediatamente acender um cigarro.

As cores representam um papel importante na vida humana. Algumas têm efeitos que deprimem e outras que estimulam. As marcas mexem com a personalidade do indivíduo, alguns tentam se satisfazer com marcas que lembram algum ídolo que faz a propaganda ou lembra o personagem das novelas ou filmes. Todo este conjunto de estímulos ocorre nas mentes humanas quando estão comprando, principalmente nos compulsivos. São tomados por todo este “torpor” e caminham por uma rota da falência, onde o prazer fala mais alto, como a droga, onde em algumas horas não há razão, apenas são guiados por uma profunda sensação de prazer em experimentar roupas, sapatos, joias, alimentos, tudo leva ao delírio.

Após retornar à realidade chega uma enorme sensação de fracasso,  vazio e desespero ao receber a fatura do cartão de crédito. Chegam a ter  sudorese, depressão e ansiedade até saldar as dívidas, quando é possível! O sofrimento de não comprar, leva a depressão e irritabilidade. Podemos chamar de abstinência. Na última fase da progressão da doença, o indivíduo ou tende a desenvolver outros vícios, ou uma falência generalizada. Dívidas irreparáveis, quando não há tratamento, dívida consigo mesmo.

A Greenwood oferece tratamento desse tipo de doença contando com uma equipe especializada para um atendimento sério e imediato, dando ao indivíduo uma recuperação emocional e familiar com possibilidade de reorganizar sua vida em relação às perdas, e principalmente de resgate da dignidade social frente aos setores públicos e aos órgãos de cobranças e reeducação financeira.

Dr.Juan Pablo – Médico(Clínica Greenwood)

Monique Brande Freitas – Psicóloga clínica (Clínica Greenwood)

Quando consumir vira doença

Casos de pacientes compulsivos por compras preocupam especialistas e começam a ser desvendados pela medicina.

Ela entrou em uma perfumaria em busca de um batom e saiu com 18 deles. Gastou R$ 40 mil num mês com objetos de uso pessoal de que não precisava. E acabou num consultório médico, em busca de ajuda para entender, e tratar, sua fissura pelo ato de comprar. A fisioterapeuta paulista Tatiana Lopes, 28 anos, sofre de um mal chamado oneomania – ou, simplesmente, compulsão por compras. Instituições como o Hospital das Clínicas de São Paulo, da Universidade de São Paulo, e a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) oferecem tratamento especializado para essa doença que, muitas vezes, é confundida com fraqueza, ostentação ou impulso de “patricinhas” e “mauricinhos”. Agora, a Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro acaba de inaugurar um ambulatório para atender as vítimas da enfermidade.

A carioca Flávia Lima, 25 anos, está se esforçando para não se tornar compradora compulsiva. O sinal de alerta veio quando as dívidas cresceram assim que saiu da casa dos pais. “Agora, estou aprendendo a me controlar para fazer uma poupança”, conta. Mas ela ainda luta contra o impulso de comprar. “Entro no cheque especial e parcelo as contas no cartão de crédito por conta de gastos com futilidades”, reconhece.

SEM CHEQUES NA BOLSA
A comerciante Larissa Raposo, 26 anos, sentiu os primeiros sintomas da doença quando passava por uma depressão pós-parto, aos 19 anos. Ela já era casada e tinha dois filhos. “Não sentia mais prazer em nada, a não ser em comprar”, conta. Aos poucos, as dívidas se avolumaram e Larissa teve seu nome incluído nos cadastros de inadimplentes. Hoje, a compulsão está controlada. Mas ela não usa cheques nem cartão de crédito

É mais uma demonstração de que os especialistas estão preocupados com a evolução do problema. E, além da ampliação dos serviços especializados, a medicina também tem se dedicado a desvendar os aspectos da enfermidade. Até hoje, as causas do transtorno não são totalmente conhecidas, mas há alguns avanços neste sentido. “Sabemos que existe uma propensão genética e que pessoas impulsivas têm maior probabilidade de desenvolvê-lo. Mas o ambiente se encarrega do restante”, explica o psiquiatra Hermano Tavares, do Instituto de Psiquiatria da USP. De fato, estímulos para compras não faltam, com tantas ofertas de compras a crédito e o apelo publicitário. É por isso que este tipo de compulsão integra a lista das chamadas doenças da modernidade. “É um mal de uma era que insufla o prazer imediato em tudo”, afirma a psiquiatra Analice Gigliotti, presidente da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas (Abead) e chefe do setor de dependência química e outros transtornos do impulso, da Santa Casa, no Rio.

Outras informações também estão ajudando a conhecer melhor a enfermidade. Sabe-se,por exemplo, que ela é mais comum entre as mulheres, Uma das hipóteses que explicariam essa constatação é o fato de que, historicamente, o papel das compras sempre foi atribuído a elas. Portanto, as mulheres estariam mais “expostas” ao objeto da compulsão. “Também é reconhecido que a oneomania, em geral, aparece quando o indivíduo atinge certa independência financeira”, diz a psicóloga Ângela Duque, do Serviço de Psiquiatria da Santa Casa carioca.

Uma das grandes dificuldades no entendimento da patologia, porém, é reconhecer quando ela se torna uma doença. Hoje, a psiquiatria define alguns parâmetros que ajudam nesta tarefa. O primeiro é verificar se o hábito – no caso, comprar demais – está trazendo prejuízo à vida pessoal, profissional e social. Alguém que está devendo muito e mesmo assim não consegue parar de comprar já está doente. Outro indicativo é o próprio sentimento experimentado pelo indivíduo. “Se após as compras a euforia dá lugar à vergonha, à culpa ou ao arrependimento, pode ser um sinal da compulsão”, explica Analice.

Outro obstáculo já detectado pelos especialistas é a relutância dos portadores em procurar auxílio médico. Na opinião da psicóloga Juliana Bizeto, coordenadora do ambulatório de transtornos não-químicos da Unifesp, isso ocorre muito em razão de a compulsão por compras ser um transtorno mais aceito socialmente, diferentemente do alcoolismo ou da dependência de drogas. Ou seja, nem o doente nem sua família entendem que é uma enfermidade e que, como tal, deve ser tratada.

Esta falta de percepção é um equívoco lamentável. “As pessoas precisam saber que a doença existe para evitar o sofrimento desnecessário. Com o tratamento, alcançamos bons resultados”, garante o psiquiatra Hermano Tavares. Hoje, as opções de tratamentos baseiam-se em psicoterapia, medicação (antidepressivos e ansiolíticos) e no treinamento do paciente para que ele aprenda a usar melhor o dinheiro. “Ninguém pode passar o resto da vida sem comprar. Por isso, o aprendizado de como lidar com o problema é tão importante”, explica a psicóloga Ângela.

fonte: Istoé