Dr. Pablo Miguel Roig   

Médico Psiquiatra – Sócio Fundador e Diretor Clínico da Clínica Médica Greenwood. São Paulo/SP – 23/08/2021.

                   No dia 21/08/2021 tive a oportunidade de participar do Festival CIEE da Diversidade, abordando o tema “Diversidade no Conceito de Sucesso”. Foi um encontro misto, em que os participantes panelistas se apresentavam em forma presencial e o público em forma virtual. Teve uma frequência de inscritos que superou os 15.000, dando conta do grande interesse que suscitou. Tive a honra de compartilhar o painel com Flaysa Vieira e Leo Fraiman, sendo nossa mediadora Daniele Botaro. Os colegas de exposição relataram sua experiência na obtenção de sucesso em sua atividade profissional, focando na possibilidade de mudar rumos que estivessem de acordo com seu esquema valorativo e a procura de bem-estar no atuar do dia a dia. Restou para eu fazer o contraponto, descrevendo a dificuldade de encontrar o sucesso com características sustentáveis em meus pacientes, já que meu trabalho com adictos, que supera os 45 anos de experiência, mostra que eles manejam valores e crenças momentâneas, superficiais, imediatas e sem análise de consequências.                                                                              Sem dúvida, ser bem-sucedido, tem características pessoais e pode estar relacionado à profissão, à vida afetiva, à paz de espírito etc. O sucesso está relacionado à motivação e à produtividade, com o objetivo de desenvolvimento pessoal, aumento da autoestima e a diminuição de características depressivas. Ao transferirmos estes conceitos a estruturas coletivas, como família, sociedade ou mesmo empresas, o sucesso está diretamente ligado à obtenção de objetivos, que devem atender aos interesses do grupo e não devem prejudicar o sucesso dos outros, respeitando os valores de todos e de cada um.

               Além da motivação, o sucesso está diretamente ligado à possibilidade de acesso à resiliência, conceito integrado no Brasil desde 2005 e definido por Melillo como a “capacidade humana para enfrentar, vencer e sair fortalecido ou transformado por experiências de adversidade”. Para tal, o indivíduo deve ter a possibilidade de aprender, num processo dinâmico e em sintonia com o meio ambiente, numa relação recíproca, aumentando a bagagem de recursos, crescendo a possibilidade de uma adaptação efetiva e eficiente para lidar com a vida.                                                                                                                                                                   Os resilientes são indivíduos otimistas, dispostos a aprender e mudar com as experiências adversas, superando obstáculos e seguindo em frente, apoiados na autoestima, na responsabilidade e a tolerância.   

           Ao rever estes conceitos e pensando na realidade de nossos pacientes, me encontrei com as suas dificuldades básicas, sua impossibilidade de planificar a médio e longo prazo, a sua incapacidade de aprender, a sua autoestima seriamente afetada, a sua visão narcísica da vida, a sua falta de integração, a não ser em grupos homogêneos auto e heterodestrutivos, e a ineficiência defensiva com que contam para lidar com vivências e sentimentos. Esta doença que vai se desenvolvendo geralmente desde a infância e a adolescência, vai minando os recursos biopsicológicos, vai mudando valores e prioridades e vai escravizando o adicto dentro duma estrutura narcísica em que só vale o “aqui e agora”, o “eu e a droga”, “não existem as consequências”, “não existe o outro” e muitos outros lemas que fogem da coerência e o transformam num psicótico dinâmico que foge constantemente da realidade e se refugia no efeito químico da droga que for, mesmo sendo o efeito efémero e totalmente ineficiente, reproduzindo o estado anterior à intoxicação, para não dizer que o agrava.

                   A noção de sucesso nestes casos não está ligada a obterem êxitos duradouros e baseados em projetos apoiados em valores básicos, como a vida, a saúde, a família, a dignidade, a verdade, etc. Em um trabalho anterior intituladoO Triunfo do Fracasso”, descrevo o conceito imediatista de êxito em pacientes que não atingiram o ponto da reorganização de valores crenças e prioridades e consideram sucesso a obtenção da droga, a planificação da recaída, driblar e enganar os esquemas terapêutico, manipular as famílias e por fim manter-se no seu projeto autodestrutivo. Claramente, neste esquema, os pacientes não atingem o que Suárez Ojeda em 1997 descreve como os pilares da resiliência e que são: introspecção, independência, capacidade de se relacionar, iniciativa, humor, criatividade, moralidade e autoestima consistente. A diferença do resiliente, o adicto responde ao que Freud definiu como “compulsão à repetição”, percorrendo sempre o mesmo caminho, numa condição de inércia vivencial e autodestrutiva. Sabemos da física que para modificar o estado de movimento inercial, deve aplicar-se uma força e este é o conceito do tratamento, que ajuda os pacientes, com muito esforço deles, das equipes terapêuticas e da própria família a proporcionar uma nova possibilidade vital e o acesso à resiliência como motor da mudança.